domingo, setembro 10, 2006

 

Direto do cérebro

O controle de membros mecânicos pelo pensamento entra em nova fase de testes com pacientes
Salvador Nogueira

Se uma fração mínima das previsões de implantes de chips em cérebros tivesse prosperado, o mundo estaria hoje repleto de ciborgues, meio humanos, meio robôs, que se conectariam à internet ao mexer no lóbulo da orelha. Isso não vai acontecer – ao menos não tão cedo. O que realmente as pesquisas perseguem na área de neurotecnologia distancia-se anos-luz desse tipo de bobagem. Um exemplo de trabalho real e contundente nesse setor está sendo realizado pelo grupo liderado pelo neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis, de 45 anos, da Universidade Duke, na Carolina do Norte, nos Estados Unidos. As técnicas desenvolvidas pela equipe de Nicolelis têm como objetivo fazer com que próteses mecânicas, como braços e pernas artificiais, sejam controladas diretamente pela atividade cerebral. No limite, as investigações podem auxiliar na recuperação de paraplégicos e tetraplégicos. O trabalho do cientista entrou numa nova fase em julho, quando começaram testes completos com pessoas, abrangendo todo o ciclo da experiência. "Agora, faremos a conexão direta entre os pacientes e membros robóticos por cerca de uma hora e meia", diz Nicolelis. "Antes, os exames eram parciais e o tempo de execução não ultrapassava dez minutos."
As etapas anteriores da pesquisa foram vencidas com sucesso. O trabalho começou a ganhar destaque internancional há seis anos, quando Nicolelis "plugou" o cérebro de pequenos macacos a um computador, introduzindo dezenas de microeletrodos, pequenos fios de metal mais finos que os de cabelo, no crânio dos bichinhos. Por meio desses dispositivos, captou sinais de atividade cerebral relacionados ao movimento de membros. Depois de interpretarem esses sinais, os computadores tornaram-se capazes de reproduzir o balançar do braço do macaco numa prótese robótica. Foi a primeira vez que uma máquina apreendeu comandos cerebrais e os traduziu adequadamente sob a forma de gestos. Nos anos seguintes, a técnica foi aprimorada, até que, em 2003, o neurocientista conseguiu autorização para fazer os primeiros testes com humanos. "É o que chamamos de validação de princípio, para mostrar que a técnica funciona tão bem com pessoas como com os macacos", observa Nicolelis, escolhido pela Scientific American, uma das mais relevantes publicações de divulgação científica do mundo, um dos cinqüenta líderes mundiais da ciência em 2004. "Sendo conservador, acredito que, em dois anos, já teremos pessoas usando membros robóticos. Os estudos nessa área evoluem com velocidade impressionante", diz o pesquisador.

Com a sofisticação cada vez maior na interpretação de sinais provenientes do cérebro, é natural que também surjam evoluções na outra ponta: na construção de artefatos robóticos que possam responder a esses sinais. É nessa linha que trabalha a equipe de Paolo Dario, da Escola Superior Sant'Anna, em Pisa, na Itália. Eles criaram uma mão robótica, conhecida como Cyberhand, justamente para esse fim. O grupo pretende testar o aparelho conectado a pacientes ainda neste ano – embora seu desenvolvimento esteja no início e os pesquisadores não esperem ter o produto disponível no mercado antes de seis ou oito anos. Mas o que surpreende no artefato é a delicadeza do toque. A mão robótica é capaz de segurar uma batatinha frita sem quebrá-la.

Notícia retirada de:http://veja.abril.uol.com.br/especiais/tecnologia_2006/p_050.html

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